Negligência na pandemia pode motivar pedidos de rescisão indireta
O Estado de Minas Gerais registrou um aumento de 27.30% nos pedidos de rescisão indireta em 2021, quando o empregado solicita o desligamento da empresa por quebra de cláusulas contratuais que tornam a relação de trabalho insustentável, de acordo com levantamento do Tribunal Superior do Trabalho (TST). No total, foram contabilizados 13.306 casos, em 2020, e 16.939 no ano passado.
O número é maior que a média nacional, que saltou de 118.736 para 134.503 no mesmo período, um aumento de 13.27%. Casos recentes julgados pelas Varas do Trabalho mostram que alguns desses processos são motivados, principalmente, pela falta de cuidados na prevenção e combate à Covid-19.
Segundo o advogado especialista em Direito do Trabalho Empresarial, Fernando Kede, do escritório Schwartz e Kede, a empresa é responsável por zelar pela segurança e saúde de todos os seus trabalhadores. Quando isso não acontece, o trabalhador pode entrar com o pedido de rescisão indireta, no qual recebe todas as verbas indenizatórias, como se tivesse sido demitido sem justa causa.
“A empresa deve fornecer todas as medidas de proteção contra a Covid-19, evitando que os funcionários sejam infectados naquele ambiente e propaguem a doença. Devem, ainda, respeitar os atestados fornecidos por médicos de serviço público, particulares ou de convênios quando se recomenda o afastamento do trabalhador em virtude da contaminação do vírus”, pontua.
A portaria interministerial número 14 do Ministério do Trabalho e Previdência, de janeiro de 2022, recomenda afastamento de 10 dias das atividades laborais para casos considerados confirmados e suspeitos, além daqueles que tiveram contato próximo com quem testou positivo.
Para casos confirmados, a empresa pode reduzir o afastamento para 7 dias desde que o funcionário esteja sem febre há 24 horas, sem o uso de medicamento antitérmicos, e com remissão dos sinais e sintomas respiratórios. O primeiro dia de isolamento de caso confirmado deve ser considerado o dia seguinte ao início dos sintomas ou da coleta do teste por método molecular (RT-PCR ou RT-LAMP) ou do teste de antígeno.
Quando a empresa não respeita os protocolos sanitários recomendados pelos órgãos de saúde e trabalho, é possível que o trabalhador entre com o pedido de rescisão indireta. “Ele sai da empresa e pleiteia junto à Justiça do Trabalho todas as verbas rescisórias que ele teria direito se fosse demitido sem justa causa, porque o empregador está descumprindo o contrato de trabalho”, explica.
Danos Materiais
Empregador pode, ainda, ser condenado a indenizar o trabalhador por danos morais. “Se o funcionário ainda passar por alguma humilhação ou ser forçado a trabalhar de uma forma que possa lhe causar algum constrangimento como, por exemplo, trabalhar contaminado pela Covid-19, a empresa pode responder judicialmente pelo fato e ser condenada”, diz Kede.
Recentemente, a 66ª Vara do Trabalho de São Paulo reconheceu o pedido rescisão indireta de contrato de uma ex-funcionária do Burger King e condenou a empresa a pagar R$ 15 mil de indenização por dano moral após comprovar que ela foi obrigada a trabalhar mesmo após apresentação de atestado médico de infeção por coronavírus. Logo depois, a empresa foi condenada novamente a pagar rescisão indireta a outro funcionário também por recusar o comprovante médico pela 6ª Vara do Trabalho da Capital.
Outros casos de rescisão indireta também foram reconhecidos pela Justiça Trabalhista, como o caso de um motorista de ônibus em Carapicuíba que comprovou nunca ter recebido equipamentos de proteção mesmo trabalhando em meio aglomerações. O vigilante de uma empresa que presta serviços ao Hospital Municipal Tide Setúbal também teve seu pedido aceito pela 14ª Vara do Trabalho de São Paulo. O colaborador não recebeu EPI’s contra a Covid-19, foi contaminado e, ao retornar e exigir os equipamentos de proteção, foi ameaçado de demissão por justa causa. Nesse caso, após a perícia, a empresa ainda foi condenada a pagar adicional de insalubridade já que o benefício não era previsto no contrato.
Kede recomenda que empregadores sigam os protocolos exigidos pelos órgãos sanitários, de saúde e do trabalho para evitar ações trabalhistas nesse sentido. “É fundamental adotar as medidas de prevenção necessárias e respeitar os atestados. É importante também fornecer os equipamentos de segurança e proteção contra a doença”.
Além disso, é importante comprovar o que a empresa está fazendo para prevenir e conter a propagação do vírus. “A comprovação pode ser feita por meio de fichas de entregas de produtos e fotos, por exemplo. O importante é que tudo seja registrado”, orienta.
Fonte: Jornal Contábil.